quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Geografia e religião:animismo e sincretismo


O estudo em geografia e religião têm-se tornado um campo iminente para estudos sobre o espaço. Os autores buscam caminhos interpretativos para aproximação com o fenômeno religioso, os quais ainda estão em fase de evolução e crescente discussão acerca do tema e dos métodos utilizados para avaliação dos casos estudados.
Para o início dessa apresentação, podemos resgatar o estudo de Sylvio Gil Filho, que aborda o tema através dos conceitos de território, territorialidade e representações sociais. 
Sem dúvida essas propostas colocam a necessidade de revisão e expansão dos parâmetros de avaliação conceitual na geografia humana, resultando em avanços científicos. Por isso, queremos levantar algumas práticas do ponto de vista Animista.
O Animismo manifesta-se em diversos povos, principalmente aqueles com características autóctones, ou seja, nativos de uma dada região geográfica como é o caso de povos indígenas no Brasil e dos esquimós no ártico. A origem da palavra é o ànima, que em grego é correspondente ao vento externo, o elemento natural. Quando o termo é traduzido ao Latim se refere ao ar interno, aquele que dá movimento, ritmo aos corpos (Dicionário Escolar, MEC; 1969). As práticas animistas são muito variadas e podem ser discernidas por conta dos condicionantes culturais dos povos em evolução com suas regiões originárias. Porém, um princípio é compartilhado para identificar o animismo: a crença de que todos os elementos naturais possuem alma, extinguindo a hierarquia entre elementos vivos ou não-vivos, sendo essência consciente de todos os fenômenos materiais e espirituais.
A religiosidade institucional e todos os seus signos marcam o espaço imanente e são representações de sua ontologia transcendental ao exercerem “o papel do além” (Claval; 1999), tornado característica fundamental –através do espaço- da noção de ancestralidade que constitui a gênese de determinadas culturas e de seus objetos de crença fundamentados na religião. Essa construção socio-histórica foi expressa na supressão das religiões pagãs e dos povos tradicionais na europa medieval, seja na estrutura social hindu subdividida por castas rígidas e hereditárias ou nas imensas teocracias de países do oriente médio. 
Dessa forma, o animismo se diferencia da religião politeísta ou monoteísta, no tocante às formas de interpretar a causalidade dos fenômenos e no modo como estes influenciam a conduta de um dado grupo ou indivíduo. O animismo é geralmente considerado como uma forma pouco evoluída de prática espiritual, não dotada de complexidade. O ritual indígena da “dança da chuva” -bastante difundido pelo senso comum no Brasil- constitui uma prática que louva os espíritos dos céus para a obtenção de uma colheita farta. As oferendas que incluem matança de animais e pessoas, a digestão de alguns órgãos por tribos antropofágicas são ações relativas a crenças com base no animismo.
Os Iorubás africanos, em relação intrínseca com os Aborígenes australianos- esses últimos migraram desde a África aproximadamente 50.000 anos (G1 notícias; 09/05/2007)-, e diversas manifestações no sudeste da Ásia, são algumas evidências de resistência do animismo no intervalo das grandes religiões mundiais em cada continente. Aliás, essa é a forma que ganha o animismo na contemporaneidade, através do sincretismo religioso, entre as de cunho universalista (Islã, Budismo, Cristianismo) e outras com cunho étnico, o que pode ser observado nas casas de umbanda no Brasil e nos Andehus na Tailândia (entre budismo e animismo).
O caráter de “minoria” de praticantes dos sincretismos os coloca em situação de desvantagem com relação as grandes religiões. No Brasil, o neopentecostalismo difunde a ideia de constringir os cultos afro-brasileiros (Silva; 2011), o que põe em risco os seus praticantes por conta de intolerâncias de cunho religioso.

João Pedro Izé Jardim

Referenciais(sítios):

CLAVAL, Paul. Geografia cultural: o estado da arte. 1999.
Pereira, Clevisson. Resenha: Espaço Sagrado, estudos em geografia da religião. Gil Filho, Sylvio. Revista Brasileira da História das Religiões; 2009.
Gomes, Wiliam. Primeiras noções da Psique: das concepções animistas às primeiras hierarquias em antigas civilizações. UFRGS, 2004.
Silva, Rachel. Geografia e religião afro-brasileira. XI CONLAB; 2011

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

As boas notícias sobre África são ruins para os negócios - Fiona Leonard

Resumo em português:

Escrever uma história positiva sobre a África seria ruim para as estatísticas de leitores de um jornal, disse um colunista do The New York Times.


"Já é muito difícil ter leitores interessados na África (cada vez que escrevo sobre África minha coluna desaba), e uma coluna com boas notícias, não ligada a uma crise (Benin prospera!), francamente terá zero leitores.'' (N. Kristof, NYT, 1/7/11)


Os comentários de Kristof apareceram há poucos dias, juntamente com um artigo que ele escreveu: ''Uma aventura africana e uma revelação''. O artigo descreve uma viagem recente a ''cinco países particularmente malditos''. A única luz positiva era a tecnologia - energia solar e celulares. No fim, repete um clichê de nativos selvagens/felizes: ''as girafas e os locais são incrivelmente acolhedores e o progresso no momento é efervescente''.


Muitas ONGs sofreriam realmente se os jornalistas começassem a escrever boas notícias. Quando CARE International levou um escritor a um país africano, não mostraram-lhe lugares ricos, essa não era a história que pretendiam que fosse contada. O orçamento da ajuda está encolhendo e os governos estão sendo pressionados a gastar no país e não no exterior.


A resposta para ''como cobrir a África'' deve estar em complicar mais do que em simplificar a história. Explicar as complexidades da questão. África é um continente não um país.


Em vez de ''doar dinheiro'' à África por razões humanitárias, chamemos as coisas pelo seu nome e admitamos que os governos estrangeiros estão investindo. Sejamos honestos e reconheçamos que a ajuda está relacionada ao comércio e a imperativos econômicos a longo prazo. Alguns deles são embaraçosamente comerciais, como querer o acesso das companhias mineradoras.
É hora de começar a contar uma história diferente.



Texto inteiro em espanhol: http://www.rebelion.org/noticia.php?id=133516

Comentários da equipe África na Geo:

Neste texto, autora, Fiona Leonard, que vive em Gana atualmente, escreve uma crítica a partir do que N. Kristof, colunista do New York Times (NYT), um dos principais jornais do mundo, e com certeza o mais influente jornal estadunidense, sobre a forma como é tratada as informações que nos passam sobre África.

Kristof deixa um ganho no seu texto (que não aparece aqui, mas Fiona traz alguns trechos) e faz uma intervenção qualificadíssima. Ela se impressiona quando o colunista pergunta em seu texto "como devemos cobrir a África (no jornal)?".

Impressionou-se Fiona ao deparar-se com tal questionamento, pois afinal de contas o NYT, assim como toda a mídia internacional, costuma sempre apresentar a África como lugar de pobreza, sofrimento, guerras, dor. Mas quando Kristof escreve:

"O resultado é que tenho medo que às vezes criamos uma percepção pública da África como um caso perdido de uma forma desestimular o turismo eo investimento das empresas. Se for esse o caso, então os nossos esforços para ajudar a África a fazer nada, mas prejudicá-lo ".

Assim, ela se motiva a ler o texto, mas no final conclui:

"No momento em que cheguei ao final do artigo realmente senti que Kristof estava lutando contra seu próprio dilema. Ele queria escrever algo bom, mas não tinha nada de bom para dizer. No final, ele volta a fazer um clichê de nativos selvagens /felizes".

Então ela cita a frase de Kristof que exemplifica sua crítica:

"Este é o tipo de história sobre Africano-geral ouviu uma dica de armas e caos, e é real, mas também incompleta. Como descobri os vencedores da" viagem Win-a-"nesta viagem, a pobreza é incerteza angustiante e ameaçador. Mas as girafas e os locais são incrivelmente amigável e progresso no momento é efervescente".

Assim Fiona sugere a Kristof algumas formas de melhorar sua forma de escrever sobre a África:

1. Não falar tanto de África no sentido geral, como se ela fosse uma coisa só. Fale da África mas situe os lugares, as regiões. "A África é composta de 54 estados soberanos e seis diferentes regiões: Norte da África, Sul da África, África Ocidental, África Oriental e Central e África Sub-Saariana". (Para treinar o entendimento das divisões políticas atuais ver a página "mapas interativos" no parte superior da interface do blog)

2. Em vez de falar que governos estrangeiros "dão" ajudas humanitárias para a África, dizer que eles na verdade estão investindo. "Vamos ser honestos e reconhecer que a ajuda está ligada ao comércio, a ajuda está vinculado a longo prazo imperativos econômicos".

3. Não julgar os comportamentos culturais com olhos ocidentalizados. "Talvez se ele (Kristof) tivesse tido tempo para pedir às pessoas que falam a língua que estava acontecendo, pode ter tido uma ideia das nuances da situação".

Mia Couto - Mudar o medo

Excelente texto de Mia Couto - biólogo e escritor moçambicano - onde fala, em uma conferência sobre segurança, realizada em maio de 2011, – com extrema sensibilidade – sobre o medo que nos aprisiona, silencia, o medo que nos impede de olhar o outro e descobrir as belezas do desconhecido.


No Moçambique colonial em que nasci e cresci, a narrativa do medo tinha um invejável casting internacional: os chineses que comiam crianças, os chamados terroristas que lutavam pela independência do país, e um ateu barbudo com um nome alemão. Esses fantasmas tiveram o fim de todos os fantasmas: morreram quando morreu o medo. Os chineses abriram restaurantes junto à nossa porta, os ditos terroristas são governantes respeitáveis e Karl Marx, o ateu barbudo, é um simpático avô que não deixou descendência.

O preço dessa construção [narrativa] de terror foi, no entanto, trágico para o continente africano. Em nome da luta contra o comunismo cometeram-se as mais indizíveis barbaridades. Em nome da segurança mundial foram colocados e conservados no Poder alguns dos ditadores mais sanguinários de que há memória. A mais grave herança dessa longa intervenção externa é a facilidade com que as elites africanas continuam a culpar os outros pelos seus próprios fracassos.


Leia mais em: http://ebooksgratis.com.br/informacao-e-cultura/papo-cabeca/papo-cabeca-murar-o-medo-%e2%80%93-mia-couto/#ixzz1cgaV60B7